EPISÓDIO 1

Porto Alegre, RS. Dezembro de 2010.

Cam faz um giro pela cidade de Porto Alegre. Corta para um shopping todo decorado para o Natal. O movimento era intenso. Cam aproxima e encontra mãe e filha carregadas de embrulhos e sacolas.

Tatiana – Filha, imagina se nós tívessemos deixado as compras pra última hora...
Bruna – Prefiro nem pensar nisso.
Tatiana – Apesar de que não iremos fazer festa esse ano, sempre é bom comprar novos enfeites pra decoração, não é?
Bruna – Pra mim tanto faz. Quem tem essa mania é tu, mãe! (risos)
Tatiana – Ah, manias à parte, vai dizer que não é legal ter sempre algo novo?

As duas estavam descendo na escada rolante. Enquanto elas saem do shopping, cam mostra um papai-noel e seu duende ajudante tirando fotos com as crianças. Corta para a casa da família Teixeira.

Bruna – Pronto, mãe. Já guardei tudo.
Tatiana – Ótimo. Amanhã organizamos os presentes. Seus avós vão adorar as roupas que compramos.
Bruna – Tomara. No ano passado, a vovó ficou super zangada porque o papai deu um par de meias laranjas pra ela...
Tatiana – Ah ... é, é verdade. Venha cá me ajudar com os enfeites na sala.
Bruna – Tô indo.
Tatiana – Amanhã você convida o Pedro pra montar a árvore, enquanto eu trabalho, tá?
Bruna – Tá bom.

Com um fundo de música de Natal, cam corta para a Finlândia. Entre morros cobertos de neve, está uma fábrica de brinquedos.

Trabalhador – Mais uma carga pronta! Posso fechar o caminhão, chefe?
Chefe – Pode fechar, Jorge.
Jorge (indo fechar) – Esses brinquedos terão uma viagem longa até chegar na loja em... o quê foi aquilo? (grita assustado)
Chefe – Aconteceu alguma coisa?
Jorge – Não, é... bem... Parecia que tinha visto algo brilhando aí dentro do caminhão.
Chefe – Deve ter sido o reflexo.
Jorge – Mas reflexo dá onde? Está tudo escuro aí dentro e aqui fora não tem sol...
Chefe – Ande logo. A carga não pode atrasar.

Jorge entra, desconfiado, no caminhão e dá uma olhada nas caixas de brinquedos e outros objetos. Ele tinha certeza que havia algo de diferente por ali. Subitamente, ele vê: o brilho dourado novamente aparece, saindo de dentro de uma caixa. Jorge lê o número “031” na caixa.

Chefe – Jorge! Você quer perder o emprego?

Contrariado, Jorge finalmente fecha as portas. Em meio ao escuro, novamente um brilho vêm de dentro de uma caixa. Cam acompanha a viagem do caminhão. O veículo chega ao seu destino. Os brinquedos são colocados no depósito da loja. No dia seguinte, eles já estão nas prateleiras. Um homem entra no estabelecimento.

EPISÓDIO 2

Cam acompanha o homem barbudo que entrara na loja. Ele observa as prateleiras, buscando algo. Uma vendedora aparece:

Vendedora – Olá, senhor. Posso ajudar?
Homem – Estou procurando um presente...
Vendedora – Que tipo de presente? É pra uma criança?...

O tal homem a deixa falando sozinha. Ele já havia encontrado o presente ideal.

De volta à Porto Alegre, Bruna e seu amigo Pedro montam a árvore de Natal. Ou tentam.

Bruna – Cuidado Pedro! (uma bolinha de vidro cai no chão e quebra) Ai, minha mãe vai me matar. Essa ela comprou ontem.
Pedro – Desculpa, Bruna. Mas uma a mais, uma a menos não vai fazer diferença, vai?
Bruna – Ah, pra mamãe vai.
Pedro – Mudando de assunto, vocês não querem ir à minha casa no Natal? Papai vai voltar de viagem no fim da tarde e cheio de presentes. Vai ser maneiro.
Bruna (meio triste) – O seu pai esteve fora muito tempo?
Pedro – 6 meses. Ele foi trabalhar no exterior e só vai ficar por aqui alguns dias.
Bruna – Tu sente saudade?
Pedro – É claro que sim. Mas ele volta pro Natal, não é? Vou ver ele de novo daqui a três dias. E aí, tu quer ir na minha casa?

Bruna não responde. Tinha ficado triste com esse assunto.

Pedro – O que houve?
Bruna – Nada, não. Eu acho que minha mãe vai querer ficar por aqui mesmo. É que meus avós vão vir, sabe?
Pedro – Tá legal, então. Mas se vocês mudarem de planos, podem aparecer lá em casa.

Os dois continuam a colocar os enfeites na árvore natalina. Mais umas duas bolinhas acabam quebrando. Mas dessa vez quem as derrubou foi Bruna. Cam se afasta da casa e corta para o centro de Porto Alegre. Um menino de rua caminhava sozinho. No outro lado da calçada, Marcelo, que trabalha nos Correios e estava fazendo entregas, vê o garoto e sente pena. Atravessa a rua e vai falar com ele.

Marcelo – Oi. Tu tá sozinho?
Garoto (sem olhar para Marcelo) – Tô.
Marcelo – Onde estão seus pais?

Vendo que o menino não queria conversa, tira algo do bolso.

Marcelo (oferecendo pro menino) – Quer esse chocolate?
Garoto (levanta e cabeça e olha para Marcelo e o chocolate em sua mão) – Quero sim.
Marcelo – Pode pegar. Qual o seu nome?
Garoto (morde um pedaço e responde) – Samuel.
Marcelo – Você não tem família, Samuel?
Samuel – Não.
Marcelo – Já almoçou hoje?
Samuel – Não como nada há dois dias.
Marcelo – Quer ir até a minha casa? Lá tenho comida pra ti.

Samuel se assusta com a oferta e, achando que Marcelo queria lhe fazer mal, corre pro outro lado da rua, mas acaba sendo atropelado por um carro.

EPISÓDIO 3

Cam repete a cena do atropelamento de Samuel.

Marcelo (gritando) – Samuel!!!

Marcelo corre para o garoto que estava caído na frente do carro, inconsciente. Logo a ambulância chega e eles vão pro Hospital das Clínicas de Porto Alegre. Anoitece. Cam mostra a casa de Tatiana e Bruna. A jovem conversa com a mãe na cozinha.

Tatiana – Eu vi o trabalho que tu e o Pedro fizeram com a árvore. Apesar dela ter ficado um pouco torta, com os enfeites pendurados de qualquer jeito e ... (mostra uma pazinha de lixo com cacos) com três bolas quebradas, o importante é o espírito do Natal.
Bruna (surpresa) – Como tu sabe que são... ou foram três bolas?
Tatiana – Todo ano era eu quem preparava a árvore, não é? Eu conheço os enfeites natalinos.
Bruna – Ah, é mesmo (rindo). Mas tu se enganou numa coisa, mãe. Foram quatro bolas quebradas. Acabei quebrando mais uma, que estava dentro da caixa. Deixei lá dentro.
Tatiana – Como tu é desajeitada com essas coisas, Bruna. Também, essa é a primeira vez que tu se encarrega da árvore...
Bruna – É, esse ano a responsabilidade ficou pra mim porque...
Tatiana (completando) – ... porque tenho que trabalhar. Até o último ano, seu pai trabalhava e eu cuidava da casa e do Natal.

Haviam tocado no assunto que Bruna queria falar: o pai. Começa um rápido flash back, revivendo cenas do início daquele ano. O pai de Bruna, Luís, foi chamado para comandar a filial de uma empresa na Finlândia. A oportunidade era única, e ele não presisava ficar lá por muito tempo. Ele foi e mãe e filha ficaram. Mas logo a felicidade na família pelo novo posto acabou. Luís começou a beber, até que foi demitido. Por vergonha, nunca mais deu notícias à Tatiana e sua filha. Elas só sabiam que ele tinha sido demitido. Depois do aviso da empresa, nada mais souberam de Luís. Acaba o flash back e Bruna pergunta à mãe.

Bruna – O que será que aconteceu com o papai?
Tatiana – Ah, filha, já conversamos sobre isso tantas vezes. Qualquer coisa pode ter acontecido.
Bruna – Eu sei, mas esse é o primeiro Natal sem o papai. Tá difícil...
Tatiana – Vem cá, filhota (abraça Bruna). Quem sabe ele não chega de surpresa até lá?

Corta pro Hospital das Clínicas. Marcelo está sentado da sala de espera, quando surge o médico.

Médico – Você que é o pai do garoto atropelado?
Marcelo – Não. Ele encontrei ele na rua. Como ele tá?
Médico – Não houve nenhum arranhão, foi só um susto. Esse jovem está com anemia, teve estar a algum tempo sem comer.
Marcelo – Ele me disse isso. Mas ele vai ficar bom?
Médico – A recuperação pode demorar alguns dias. Se quiser, pode ficar ele no quarto.
Marcelo – Vou ficar sim. Me afeiçoei ao Samuel.

Naquela noite, no quarto, Samuel acorda e vê Marcelo na poltrona ao seu lado.

Samuel – O que aconteceu? O que o senhor faz aqui?
Marcelo – Calma, Samuel. Está tudo bem. Você foi atropelado por um carro e agora tá no hospital. Eu não vou te fazer mal, só quero ajudar.
Samuel (voltando a ter confiança) – Como o senhor se chama?
Marcelo – Me chamo Marcelo, mas não precisa me chamar de senhor, não.
Samuel – Tu quer ser meu amigo, Marcelo?
Marcelo – É claro que quero. (risos)

EPISÓDIO 4

Ao som de uma música natalina, folhas de um calendário vão sendo arrancadas, ao mesmo tempo em que imagens da rua onde moram mãe e filha, mostram os preparativos das famílias para o Natal. Na véspera do 25 de dezembro, o telefone toca e Bruna atende, ansiosa.

Bruna – Alô? Pai, é você?
Pedro – Oi Bruna, é o Pedro! Meu pai chegou agora a pouco. Tá uma festa aqui em casa.
Bruna (desapontada) – Que legal...
Pedro – É mesmo. Ele se deu super bem lá fora e trouxe muitos presentes. Tem certeza que não quer dar uma passada aqui?
Bruna – Desculpa, Pedro. Mas é que minha mãe tá preparando a ceia e eu tô ajudando. Meus avós também já chegaram.
Pedro – Quer que eu guarde um presente do papai? Tem uma coisa aqui que eu acho que tu vai gostar. Pode ser?
Bruna – Ah, não precisava, mas tudo bem.
Pedro – Então eu guardo e amanhã te entrego.

A noite de Natal não foi tão feliz assim. Apesar da comida boa e de alguns presentes que ganhou de sua mãe e dos avós, Bruna se sentiu muito só e triste.

Tatiana – E aí, mãe? Gostou da blusa que comprei pra ti?
Avó – Melhor do que as meias laranja do ano passado. (todos riem)
Bruna (pensando) – Queria que o meu pai estivesse aqui. Com meias laranja ou sem meias laranja.

A noite passa e chega o dia de Natal. Logo pela manhã, Marcelo passa na rua de Tatiana e Bruna, entregando correspondências e embrulhos. Deixa na casa delas um pacote.

Tatiana – Ah, obrigada.
Marcelo – Um feliz Natal pra senhora.
Tatiana – Pra você e pra sua família também.
Marcelo (caminhando e pensando) – Pra minha família.

Aquela foi uma das última entregas e ele estava indo ver Samuel: sua família. Cam corta para o quarto de Bruna. A mãe entra.

Tatiana – Filha, acorda! Chegou um presente pra você (mostrando um embrulho bem feito).
Bruna (sonolenta) – D-deve ser do Pedro, deixa eu ver...

Bruna senta na cama e lê o cartão: Um Feliz Natal do Joulupukki, Suomen.

Bruna – Acho que não é do Pedro, não.
Tatiana (lendo o cartão) – Que língua é essa? De quem será?

Bruna sacode o pacote, de leve. Ouvem o barulho de algo não muito pesado, com o som amortecido por alguma coisa. Na Finlândia, Jorge, que trabalha na fábrica de brinquedos, folheia papéis de cargas entregues naquele mês. Ele encontra as folhas da entrega daquele dia em que viu algo estranho no caminhão.

Jorge – Ué. Procurei dias por isso e só achei agora. Qual era mesmo a referência daquela caixa? Ah, era “031”. Deixa eu ver...

Jorge procura na lista e encontra o item.

Jorge – Porta-retratos??? Aqui não fazemos porta-retratos!

EPISÓDIO 5

Cam mostra Bruna e Tatiana sentadas na cama, ainda com os olhos no presente e seu cartão.

Bruna – Suomen. Acho que já vi algo parecido com isso...
Tatiana – Agora que falou, filha, eu também lembro de alguma coisa assim nas... cartas da empresa em que seu pai foi trabalhar no início do ano. É, é isso mesmo!

Bruna levanta e liga o computador.

Tatiana – O que tu vai fazer?
Bruna – Se isso aí (aponta pro cartão) for finlandês, só tem um jeito de descobrir o que significa: internet.
Tatiana – Deve ser algo da empresa, né?
Bruna – Não sei, mãe.

Ela entra no Google Tradutor, escreve Joulupukki, Suomen, faz a conversão e espera alguns segundos...

Bruna – Papai-Noel da Finlândia???
Tatiana – Agora eu não entendi. Isso é de um papai-noel?
Bruna (coçando a cabeça, confusa) – Pelo que parece...
Tatiana – Tu vai abrir?
Bruna – Não tem jeito.

Muito devagar, Bruna rasga o papel de presente e começa a abrir a caixa. “E se for uma bomba?”. Mas o que ela tira de dentro é...

Bruna – Um porta-retrato?

Era um porta-retrato. A garota olha para a foto, espantada. Lá, estavam ela, a mãe e o pai, numa fotografia tirada quando Bruna tinha 5 anos. Subitamente, um brilho dourado emana do objeto, ao mesmo tempo em que uma paz enche o quarto e os corações de mãe e filha. Virando a foto, do outro lado estava escrito Joulupukki, Suomen, junto com a imagem de Luís vestido de papai-noel.

Bruna – Ele é o Papai-Noel da Finlândia. E ele me enviou isso. Mas dá onde veio esse brilho?

Tatiana não ouviu a última frase da filha, porque viu dentro da caixa dois pares de meias laranjas com o bilhete: Para o vovô e para a vovó, com muito amor. Mas havia mais uma mensagem, encabeçada para Tatiana, que lê em voz alta.

Tatiana – As coisas não aconteceram como queríamos, e eu deixei passar uma grande oportunidade pela minha vida. Com vergonha, não entrei em contato com vocês. Me arrependo. A barba cresceu e agora trabalho como papai-noel no principal shopping no país. Sou conhecido por todos aqui como Joulupukki, Suomen. Peço perdão. Estarei aí assim que puder, depois de entregar os presentes de Natal. Um beijo.

Enquanto lia, lágrimas escorriam pelo seu rosto. Bruna já tinha voltado à internet.

Bruna – Mãe, olha só o papai!

Ela mostrava imagens do seu pai como o velho Noel na Finlândia.

Bruna – Ele é famoso, mãe! Ele é papai-noel!

As duas riem e se abraçam, felizes. No fim da tarde, Luís chega com mais presentes pra todos. A vovó gostou das meias de diversas cores que ganhou, mas a sua preferida era a laranja. A partir daquele dia, a familia Teixeira ficou sempre unida. Bruna e Pedro ficaram juntos. Luís cortou a barba, mas usa uma postiça todo Natal. Ele e Tatiana agora trabalhavam numa fábrica de brinquedos. Marcelo adotou Samuel, os dois são muito felizes. E o garoto ajuda o pai durante as entregas de Natal. Na Finlândia, de vez em quando aconteciam novas coisas inexplicáveis. Talvez fosse obra do Papai-Noel. Cam mostra a foto do pai de Bruna no porta-retrato. Um brilho dourado aparece ao seu redor, iluminando toda a sala, a casa, a rua, a cidade, o país, o mundo.

Fim.

** Web-série escrita por Henrique Weiland